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Comportamento
Autista, Análise do Comportamento, e o Gene
Richard W . Malott1
Behavior Analysis Program
Department of Psychology
Western Michigan University
Abstract
Este artigo aborda o significa de autismo, a etiologia do comportamento e dos
valores autistas, o debate natureza-criação, contingências
x genes, e a resistência a uma análise comportamental do autismo.
Prólogo
Eu sou um behaviorista radical e fanático que acha que sabe tudo que
há para se saber sobre o uso e o mal-uso das contingências de
reforçamento. Dois semestres atrás, eu comecei a trabalhar com
um belo garoto não-verbal de 4 anos em uma turma de autismo da pré-escola
na Croyden Avenue School – a primeira vez que eu pus a mão na
massa com estas crianças. E como todos meus alunos que fazem sua prática
lá, eu me apaixonei por minha criança.
Um dia, estávamos quietamente parados lá fora, esperando pelo ônibus
escolar, de mãos dadas, quando percebi uma pequena lágrima rolando
pela sua bonita bochecha. Meu coração apertou e eu imediatamente
lhe dei um caloroso abraço de aconchego e apoio, e um nanosegundo depois
percebo que estou reforçando um comportamento inapropriado, qualquer
que fosse o comportamento que escorregou daquela lágrima de partir o
coração. Só o mais frio e calculista dos professores poderia
ter resistido, mesmo depois de entrar em conflito com uma avassaladora noção
contra-intuitiva de que, geralmente, se não sempre, o comportamento
emocional pode ser controlado pelas suas conseqüências reforçadoras.
No último semestre eu tive o privilégio de trabalhar com outro
garoto de quatro anos de idade; este garoto tinha aprendido a falar durante
o ano que passou no programa. E quando chegavam as duas últimas das
suas seis horas de trabalho diário, ele perguntava com crescente freqüência, “Eu
vejo mamãe?” E o treinador das tentativas discretas reassegurava
a ele, “Sim, ao final do dia.” “Em dois minutos?” “OK,
sim, em dois minutos.” Eles freqüentemente interrompiam o treinamento
por tentativas discretas para fazer a dança de dois-minutos-da-mamãe.
Mas nós, mais experientes analistas do comportamento, sabíamos
que este comportamento disruptivo era controlado pelos reforçadores
sociais da atenção e talvez pelas breves fugas da tarefa de treinamento.
Então nós o ignorávamos, não estando preparados
para as conseqüências desastrosas, a elevação de uma
reclamação para uma completa crise, tão efetiva que fez
com que todo o grupo percebesse que coisas horríveis estávamos
fazendo com aquela pobre criança. Entretanto, o grupo concordou que
a extinção era a melhor opção de intervenção;
então eles implementaram a extinção para toda a sala de
aula – todos iriam ignorar este comportamento.
E, é claro, eu era o mais consistente em implementar este procedimento
de extinção; eu era o profissional consumado, com os olhos frios
e o coração caloroso. Pelo menos até a criança
aprender a dizer meu nome. “Dr. Malott.” Que música poderosa,
pelo menos aos meus ouvidos, “Dr. Malott.” Ele me conhece, me respeita,
precisa de mim, me admira, me ama. E provavelmente, ele até sabia que
minha calculada extinção do seu pedido de mamãe era em
nome do seu próprio interesse. Então eu continuei a extinção
com graciosa facilidade, até que depois de diversos “Eu vejo mamãe” ignorados,
ele disse, com uma reprovadora voz de partir o coração, “Dr.
Malott, eu vejo mamãe?” Eu! Ele precisa de mim! Ele precisa que
o Dr. Malott o reassegure. Foi tudo o que eu pude fazer para evitar de correr
ao seu auxílio com um reforçador rotineiro “Em dois minutos;” e
se meus alunos não estivessem discretamente me observando, eu teria
dito. É muito difícil entrar em conflito com a noção
de que o comportamento emocional pode ser mais uma resposta aprendida controlada
por suas conseqüências reforçadoras do que uma expressão
de necessidade interna, um grito de socorro do fundo da alma da criança.
Em algum momento, esta criança de cinco anos se tornou tão proficiente
em seu comportamento autista que nos deixou todos de joelhos, incluídos
os fanáticos e radicais analistas do comportamento; chegou um ponto
em que nós oficialmente acordamos com uma variação cognitiva
de “Em dois minutos” para livrar a nossa cara.
Agora, querido leitor, você pode estar ponderando consigo mesmo “É claro,
quem mandou entrar numa disputa com uma criança de cinco anos.” E
você pode estar certo, ou pode não estar. Mas o que eu quero dizer é que
mesmo quando achamos que sabemos o que devemos fazer, a análise aplicada
do comportamento pode ser tão contra-intuitiva, tão contra nossas
reações impulsivas, tão contra as contingências
imediatas, que mesmo o mais dedicado dos fiéis às vezes pode
ter problema em fazer a coisa certa.
Agora, pegue 100 milhões de pais e mães médios, sem seus
PhDs em análise do comportamento, ou mais importante, sem dez anos fazendo
treinamento de tentativas-discretas e em ambiente natural. E pegue alguma pequena
e acidental contingência que acaba afetando um pequeno e insignificante
comportamento autista acontecendo em seu filho de um ou dois anos. Não
tem como mamãe e papai fazerem a coisa certa. Não tem como não
reforçar aquele ínfimo comportamento e falhar em reforçar
o minúsculo comportamento apropriado. E dependendo do rolar dos dados,
um punhado destes episódios pode espiralar em uma pequena porcentagem
de crianças que não aprendem a falar mas aprendem todos os tipos
de alternativas terríveis. O mais espantoso não é que
há tantas crianças que não falam e fazem todos os tipos
de alternativas ruins. O mais espantoso é que tantas crianças
ainda aprendem a falar e mantém suas alternativas ruins em um mínimo.
Todos, além de uns poucos frutos caprichosos do rolar dos dados, vamos
nessa direção.
Por quê a Resistência?
Relações Públicas
Como sabem os leitores deste periódico, as intervenções
mais bem sucedidas em valores e repertórios autistas envolveram a remoção
das contingências que a análise funcional sugere manter o comportamento
autista, adicionando contingências de manejamento do desempenho que sustentem
a aprendizagem de comportamentos apropriadamente funcionais, e o pareamento
de estímulos e eventos com reforçadores para criar reforçadores
aprendidos (valores) apropriadamente funcionais. Então, o lugar óbvio
e lógico para se buscar a etiologia desses repertórios e valores
autistas é na história comportamental, não no gene. Ainda
assim, a maioria dos pais, e talvez a maioria dos analistas do comportamento,
se apoiam no gene, em grande parte talvez como defesa contra serem considerados
pais inaptos e profissionais inaptos. Infelizmente, o conceito da mãe-geladeira,
acusador da vítima, ainda não derreteu. (A mãe-geladeira
era um conceito inventado pelo psicanalista Bruno Bettelheim (1967) para explicar
por que algumas crianças eram “autistas” – as mães
eram muito frias, não mostravam amor e afeição suficientes
para suas crianças. Uau!)
Mas a necessidade de tal defesa contra a acusação da vítima
pode resultar da dificuldade em se apreciar o poder de contingências
comportamentais sutis. A aquisição pré-escolar ocasional
de repertórios autistas, etc. pode ser inevitável, a menos que
todas as crianças fossem criadas por dois PhDs em análise do
comportamento com especialidade em autismo, ajudados por uma gangue de mestres
em análise do comportamento. Esta é a idéia do prólogo.
Ninguém pode ser culpado. Ninguém pode resistir às contingências
naturais, pelo menos quando não há ninguém olhando. E
mesmo se por acaso mamãe e papai são analistas do comportamento,
uma coisa é passar algumas horas por dia consultando com os professores
ou os pais, apontar o que eles estão fazendo de errado e o que eles
deveriam fazer corretamente. Este é o seu trabalho, e mais importante,
seu único trabalho enquanto usam seu chapéu de consultor. Mas
eu não tenho me impressionado com o sucesso que pais analistas do comportamento
tem tido em implementar consistentemente contingências comportamentais
apropriadas quando retornam para suas próprias casas, onde, como todos
os pais, ficam com dor de cabeça por usar concorrentemente tantos chapéus.
Sem ajuda exterior de profissionais, é quase impossível seguir
de acordo com o livro, especialmente com uma criança que se torna cada
vez mais proficiente em comportamentos autistas. O problema não é tanto
as mães-geladeiras; são as acolhedoras, afetuosas e preocupadas
mães que fazem tudo que nossa cultura as ensinou a fazer – atender
a todas as necessidades, todas as reclamações, etc. do seu filho.
Não é fácil.
Trojan e eu (1999) fizemos uma apresentação de Power Point na
ABA de nossa abordagem de uma versão inicial da análise de Drash
e Tudor (1993) das contingências comportamentais da etiologia do autismo.
Depois disso, um dos mais proeminentes especialistas em autismo veio até mim
e disse polidamente, Excelente apresentação, e então foi
direto ao ponto, É claro, você não ia querer que nenhum
pai de autista ouvisse isso. Entretanto, o presidente do Grupo de Interesse
Especial em Comportamento Verbal da ABA colocou nossa apresentação
de Power Point em seu website, com nossa permissão. O resultado logo
demonstrou a razão da preocupação do proeminente especialista
em autismo; pelo menos um pai de autista ficou indignado.
O problema é diferenciar discussão científica de relações
públicas. Não queremos magoar os sentimentos dos pais de autista
por duas razões: Primeiro, estes pais já foram magoados mais
do que o suficiente; eu não posso imaginar a quantidade de sofrimento
pelo qual passaram. E segundo, eles pagam as contas; eles pagam os proeminentes
especialistas em autismo. Mas cientistas, teóricos e praticantes da
análise do comportamento devem ser capazes de considerar e discutir
diversas visões sobre a etiologia do autismo, incluindo a visão
de análise-das-contingências, sem medo da censura das relações
públicas. E onde eles deveriam fazer estas considerações
e discussões? Em conferências profissionais e periódicos
científicos, é claro. Exceto que, quem constitui metade da platéia
de autismo na ABA? Profissionais de autismo? Não. Pais de autistas.
E quem lê todos artigos analítico-comportamentais de autismo publicados?
Profissionais de autismo? Não. Pais de autistas. Eles devem ser os leigos
mais bem informados do mundo. Assim, tanto pais quanto profissionais devem
entender que uma análise por contingências da etiologia dos repertórios
autistas não é uma forma erudita de acusar a vítima, não é uma
tentativa de recuperar o ultrapassado conceito da mãe-geladeira do transbordante
fluxo de sucata de conceitos psicológicos desacreditados. E é esse
entendimento que eu venho tentado aprimorar na maioria da primeira parte deste
artigo.
E, neste contexto, permita-me elogiar os editores do TAVB por sua integridade
intelectual e coragem ao publicar a controversa análise de Drash e Tudor
(2003) das contingências comportamentais ligadas à etiologia do
autismo, a despeito dos bem fundados medos de outros analistas do comportamento
profissionais.
O gene me fez agir assim
Além dos problemas de relações públicas, há outra
razão para resistência a uma análise da etiologia do comportamento
autista em termos de contingências comportamentais. Assim como a natureza
abomina um vácuo, a humanidade abomina um fenômeno não
explicado. Primeiro tínhamos a noção animística
de que poderíamos explicar por que as coisas acontecem como acontecem
por causa de espíritos nas árvores, nas pedras, nos animais,
nas pessoas, e por causa de espíritos externos não encarnados
no mundo material, e por causa de espíritos malignos e espíritos
bons (Harris, 1983). Contudo, estas explicações fáceis
em termos de ficções inventadas têm dado espaço
a análises científicas mais árduas, complexas e difíceis
que, por sua vez, têm gerado tecnologias mais efetivas para se lidar
com o mundo, para guiá-lo em direções mais propícias
a um ambiente humanizado. Não mais torturamos os mentalmente enfermos
com intuito de tirar os espíritos malignos de seus corpos e almas.
Mas as complexidades e sutilezas do comportamento humano têm feito dele
o mais recalcitrante sujeito para uma análise científica, com
o resultado de que tantas pessoas têm trocado ficções explicativas,
passando dos espíritos à mente. Por quê as pessoas se comportam
como se comportam? Por causa de suas mentes, porque suas mentes lhes dizem
o que fazer, por causa de suas cognições, suas estruturas cognitivas,
seu QI, sua auto-eficácia, suas expectativas, suas vontades; obviamente,
se alguém faz alguma coisa, é porque ele teve vontade de fazer;
QED, questão respondida, e tão facilmente respondida. Contudo,
estas explicações fáceis em termos de ficções
inventadas têm dado espaço a análises científicas
mais árduas, complexas e difíceis que, por sua vez, têm
gerado tecnologias mais efetivas para se lidar com o mundo, para guiá-lo
em direções mais propícias a um ambiente humanizado. Não
mais rotulamos a criança “ autista”, automaticamente pronunciando-a
incurável, e prendemos elas em instituições pelo resto
de suas vidas.
Mas a despeito dos muitos sucessos da análise do comportamento, as complexidades
e sutilezas do comportamento humano freqüentemente permanecem um sujeito
recalcitrante para uma análise científica, com o resultado de
que até analistas do comportamento têm tomado o vagão de
troca pelas ficções explicativas, passando da mente e suas cognições
para o gene. Por que as pessoas se comportam como se comportam? Por causa dos
seus genes, porque seus genes lhes dizem o que fazer; questão respondida,
e tão facilmente respondida. Contudo, para alguns analistas do comportamento,
talvez para apenas um pequeno e infeliz punhado, estas explicações
fáceis em termos de ficções inventadas não são
boas o suficiente. O gene do QI, o gene da criminalidade, o gene da hetero/homo/bi/transexualidade,
o gene da personalidade aditiva, e o gene do autismo são explicações
muito simplistas de diferenças complexas e sutis do comportamento humano,
mesmo quando estas novas formas de determinismo biológico são
expressas em termos de química do sangue, fluido amniótico, química
cerebral, ou o que quer que seja; não é suficiente simplesmente
inventar um gene ou uma combinação de genes para abarcar o comportamento
complexo, difícil de ser mudado, como é o comportamento autista.
Não queremos ser uma versão ocidental dos cultos de cargo da
ilha do Pacífico (Harris, 1983), esperando geração depois
de geração pela chegada de um navio carregado com pílulas
de consertar genes, curar autismo, que tão facilmente tomariam conta
de todos os nossos problemas.
A Análise de Contingência de Drash-Tudor. Desta forma,
estamos em grande débito com Drash e Tudor (2004) pelos seus esforços
pioneiros em nos dar uma análise científica mais árdua,
complexa e difícil da etiologia do autismo em termos de contingências
comportamentais, uma análise que, por sua vez, pode gerar tecnologias
mais efetivas para se lidar com o mundo, para guiá-lo em direções
mais propícias a um ambiente humanizado, para ajudar a prevenção
da aquisição precoce de repertórios e valores autistas
na infância.
Penso que o artigo de Drash e Tudor é um dos mais importantes no campo
do autismo, se não no campo da análise do comportamento. Uma
coisa é dizer, É, toda essa coisa do autismo é aprendida.
Mas é outra coisa apontar um conjunto plausível e detalhado de
contingências e configurações ambientais que potencialmente
poderiam explicar a aquisição de um repertório autista
de excessos e déficits; e uma análise ambiental plausível é justamente
o que Drash e Tudor nos dão.
Entretanto, quando eu li seu artigo anterior que apresentava uma análise
similar das contingências responsáveis por atrasos verbais pré-escolares
(palavras-código para autismo) (Drash & Tudor, 1993), meu entusiasmo
foi medianamente atenuado pela possibilidade de que eles teriam gerado sua
brilhante análise do conforto de suas poltronas, com pouca experiência
real em autismo. Então eu apresentei sua análise em Los Horcones,
um dos melhores e um dos dois mais velhos programas analítico-comportamentais
para autismo no mundo (com mais de 30 anos). E eu perguntei a eles como ela
se assemelhava a sua considerável experiência em autismo. E eles
unanimemente responderam 100% (Los Horcones, comunicação pessoal,
1999). Então eu tive a oportunidade de discutir o artigo com o próprio
Drash, e perguntei a ele quanto daquilo era oriundo da poltrona e quanto vinha
de experiência. Ele disse que 100% foi baseado em sua extensa história
de trabalho com famílias e crianças com comportamento autista
(Drash, comunicação pessoal, cerca de 2000). E, felizmente, Drash
e Tudor colocaram alguns poucos estudos de caso ilustrativos ao longo de seu
artigo mais recente (2004).
É claro, alguns poucos estudos de caso/histórias de caso não
constituem uma análise experimental; eles podem convencer apenas aqueles
que já estão convencidos. Mas alguns poucos estudos/histórias
de caso podem ser o primeiro passo em direção a uma coleta sistemática
de um conjunto muito maior e mais convincente de estudos/histórias de
caso, conjunto tal que poderia mais claramente confirmar, ou desconfirmar, a
análise de Drash e Tudor das contingências comportamentais da etiologia
do autismo. E eu espero que o campo da análise do comportamento amplie
seu escopo de metodologias de pesquisa aceitáveis para que milhares de
estudos assim possam florescer.
A Pílula.Mas não vai ser fácil;
a análise de contingência de Drash-Tudor tem uma oposição
bem sustentada – a indústria farmacêutica. Essa
indústria está desempenhando um importante papel
na privatização da pesquisa básica, pesquisa
universitária e nas faculdades médicas. Bancando
os flautistas, eles criam as notas que tantos pesquisadores biológicos,
médicos, e mesmo comportamentais tocam. O gênero dessa
melodia enquadra todos os problemas comportamentais em termos de
determinismo biológico, e agora com o genoma humano no topo
das paradas, esta melodia específica tenta enquadrar todos
os problemas comportamentais em termos de gene.
Por quê a indústria farmacêutica está gastando tanto
dinheiro em pesquisa genética básica e pesquisa bio-comportamental?
Assim ela pode gastar ainda mais dinheiro anunciando e vendendo pílulas
que declara serem capazes de curar tais problemas, como por exemplo o autismo.
Assim eles podem ganhar ainda mais dinheiro vendendo a pílula ou a vacina
que poderá prevenir ou curar a terrível doença genética,
o autismo. E à medida que nossa população tem se tornado
cada vez mais obesa, enquanto espera pela pílula anti-obesidade dos
sonhos, que é tão mais atraente do que o trabalho realmente duro
de uma dieta e exercícios rigorosos, famílias têm sofrido
os crescentes horrores do autismo, enquanto esperam pela pílula anti-autismo
dos sonhos, que parece tão mais plausível e reafirmante do que
o trabalho diário, excruciantemente duro, do manejamento de contingências
necessário para reverter a caída de seu filho em um conjunto
quase irreversível de comportamentos e valores autistas; e a sociedade
espera pela descoberta do gene autista ao invés de se engajar no trabalho
realmente difícil de desenvolver e implementar procedimentos adiantados
de avaliação comportamental que poderão detectar a aquisição
precoce de comportamentos e valores autistas cedo o suficiente para aumentar
significativamente os resultados positivos das intervenções comportamentais.
Cuidado com o complexo da indústria médica/farmacêutica.
(Para uma apresentação mais cuidadosamente argumentada dos dados
que apoiam meu protesto histérico anti-indústria farmacêutica,
por favor veja Rampton e Strauber [2002], Valenstein [1998], e Whitaker [2001]).
Natureza vs. Criação vs. Natureza e Criação. Em
um equivocado esforço em aparentar mente-aberta, a maioria das pessoas,
incluindo a maioria dos analistas do comportamento dizem que não se
trata de uma questão de natureza vs. criação. Se trata
de uma questão de natureza e criação. Tudo que fazemos é parcialmente
resultante de nossa natureza herdada e parcialmente resultante de nossa criação,
aquilo que aprendemos. E é claro que isso é verdade, mas apenas
em um sentido óbvio e trivial. A questão não é,
qual é a base daquilo que fazemos? A questão é, qual é a
base das diferenças entre eu e você. E esta base pode ser toda
genética (e.g., as diferentes cores de nossos olhos) ou pode ser toda
aprendida (e.g., minha preferência por Thelonius Monk vs. sua preferência
por Britney Spears). Se você está bastante certo de que tem um
gene de Britney Spears, considere este exemplo: Dois ratos, cada um em uma
caixa de Skinner. Reforçamos com água a pressão da barra
esquerda para um rato, e a pressão da barra direita para outro rato,
com resultados óbvios. E esta diferença resultante entre pressão à barra
direita vs. pressão à barra esquerda é 100% aprendida – 100%
um resultado das contingências de reforçamento. É claro
que á uma base biológica para a pressão à barra
em si, para o seu processo de reforçamento, etc., mas nenhuma diferença
nos genes ou em outras condições biológicas pré-experimentais
explica as diferenças na preferência direita-esquerda.
E é igualmente significativo perguntar sobre a base das diferenças
em respostas operantemente reforçadas por água em duas crianças.
Uma criança diz, Água por favor, e ganha um copo d’água,
enquanto outra criança faz um escândalo e ganha um copo d’água.
Assim como na caixa de Skinner, a diferença entre as duas crianças
na freqüência de água por favor vs. escândalos também
pode ser 100% aprendida – 100% um resultado das contingências de
reforçamento descritas por Drash e Tudor (2004).
Em outras palavras, eu sugiro que na maioria das vezes não é uma
questão de natureza e criação, mas é mas significativo
falar sobre natureza vs. criação. E a natureza muitas vezes pode
perder quando estamos comparando porque uma pessoa difere de outra. A natureza
forma a base de quais são nossos reforçadores incondicionados,
mas a criação determina qual barra nos pressionamos.
Comportamento Verbal sobre Comportamento Autista
Parece que quase tudo o que li sobre comportamento autista começa explicando
que o autismo não é um único transtorno, mas sim um rico
conjunto de transtornos; algumas crianças não falam, outras sim;
algumas fazem escândalos, outras não; algumas agridem, outras
não; algumas se auto-estimulam, outras não, etc., com todas as
possíveis combinações dos problemas precedentes e muitos
outros. Minha questão é por que misturar todos estes problemas
sob o rótulo de autismo? Por que não simplesmente dizer que existe
uma quase infinita variedade de maneiras que o repertório e os valores
de uma criança podem entortar. E às vezes algumas crianças
acabam com tantos problemas de tamanha severidade que precisam de ajuda profissional,
e terminam indo para esse lado. Por que até mesmo nós analistas
do comportamento continuamos emperrados por nossos ancestrais psicodiagnósticos,
com sua necessidade de colocar rótulos em todo mundo, rótulos
que se materializam como causas psicodinâmicas ou genéticas do
comportamento humano.
Além disso, muitas pessoas, inclusive eu, não se sentem confortáveis
em aplicar rótulos às pessoas, como dizendo, Jimmy é autista.
Seria mais preciso dizer, Jimmy tem um repertório autista. Alguns começaram
a usar a expressão, com autismo, como em, Jimmy está com autismo.
E ainda que o desejo de parar de rotular as pessoas seja nobre, expressões
tal como com autismo podem causar ainda mais problemas. Elas sugerem que autismo é uma
coisa, como uma doença, uma gripe que a pessoa pegou. Isso nos leva
a inferir uma entidade causal do comportamento da pessoa, uma forma ilógica
de análise – reificação, argumentação
circular: Por quê Jimmy age de forma estranha? Porque ele tem autismo.
Como você sabe que ele tem autismo? Porque ele age de forma estranha.
Por que ele age de forma estranha? Porque ele tem... E continuamos o argumento
circular. Melhor é simplesmente dizer que ele tem um repertório
de comportamentos autistas e então procurar independentemente pelas
causas – por exemplo, as contingências passadas e presentes de
reforçamento e fuga (Malott & Trojan, 2004).
Entretanto, repertório não abarca tudo. Além de ter demasiados
comportamentos inapropriados, como fazer escândalos, e comportamentos
apropriados insuficientes, como comportamento verbal (também conhecido
como linguagem), a criança pode ter demasiadas condições
ou estímulos aversivos inapropriados, como o abraço, e pouquíssimos
reforçadores apropriados, como sorrisos. (Eu uso valores para encompassar
as condições reforçadoras e aversivas de uma pessoa.)
Então pode ser mais seguro falar sobre o repertório autista (comportamentos)
e os valores autistas (condições reforçadoras e aversivas)
de uma criança. Isto pode nos ajudar a evitar adotar de forma impensada
um modelo médico/genético/farmacêutico simplista.
O termo transtorno pode tender também a fortalecer um modelo médico
reificante, implicando que existe uma doença chamada autismo e que é um
transtorno biológico. Nós não diríamos que o rato
da caixa de Skinner que ainda não aprendeu a pressionar a barra tem
um transtorno, nem diríamos que eu que nunca aprendi a falar russo tenho
um transtorno, e nem deveríamos dizer que minha tendência em relação à ironia
e ao sarcasmo é um transtorno, não importa o quão ofensivo
isso pode ser. Estes são todos comportamentos e valores que foram ou
não foram aprendidos, assim como os comportamentos e valores autistas
da criança que foram ou não foram aprendidos.
De forma semelhante, faríamos bem em banir a palavra “desenvolver” do
nosso vocabulário psicológico, com sua sugestão de que
nós passivamente desenvolvemos biologicamente como uma flor ou um tumor.
Dizer que o autismo é um transtorno do desenvolvimento é como
dizer que o rato não aprender a pressionar à barra ou eu não
aprender russo é um transtorno de desenvolvimento.
E o termo da moda comunicação também pode nos colocar
em problemas. Até os analistas do comportamento tem uma leve tendência
a dizer que todo ato autista inapropriado é o esforço da criança
para se comunicar, para expressar suas necessidades. Então, é claro,
devemos tentar descobrir o que a criança necessita, devemos suprir suas
necessidades; e, como resultado, acabamos reforçando todo tipo de comportamento
autista que não têm nada a ver com necessidades mas são
meramente respostas operantes reforçadas por suas conseqüências.
Os analistas do comportamento profissionais podem estar dando um passo para
trás para cada dois passos à frente quando atendem a este distorcido
modelo de comunicação expressiva chamando o simples reforçamento
diferencial de treinamento de comunicação funcional por comportamentos
alternativos.
Fazemos um desserviço ao importante conceito de comunicação
quando tentamos obter validação social usando comunicação
para justificar nossas contingências analítico-comportamentais
básicas. Não deveríamos distorcer comunicação
no intuito de prematuramente dar a todos, inclusive a nós mesmos, uma
sensação de conforto. Faríamos melhor em reservar comunicação
para nossos objetivos de maior nível no treinamento da linguagem.
Conclusões
Eu sugiro que o modelo por análise de contingências de Drash e
Tudor (2004) sobre a etiologia do autismo constitui uma grande contribuição
aos campos da análise do comportamento e do autismo, que não
devemos deixar questões políticas interferirem em nossa apuração
de seu valor prático e científico, de seu potencial para aliviar
e prevenir o profundo sofrimento de famílias que têm crianças
com repertórios autistas, e que um entendimento das sutilezas e complexidades
das contingências comportamentais deve deixar claro que o modelo Drash-Tudor
de forma alguma culpa as vítimas (i.e., a família).
Referências Bibliográficas
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Drash, P. W., & Tudor, R. M. (1993). A functional analysis of verbal delay
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Malott, R. W. & Suarez-Trojan, E. W. (2004) Principles
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